30 outubro, 2006

«Muita Merda!»

«Muita Merda!» «Merda! Merda!» «Muita Merda para ti» «Break a Leg!»
Estas foram as ofensas mais bem recebidas que ouvi e dirigi na 6ª feira passada.
Sim, sim: Já foi a estreia, a minha “Premier” e o dia de maior nervosismo (JURO) da minha vida – até agora.
Outras palavras houve de felicitações, portanto está a ser injusto da minha parte dar este título “depreciativo” ao Post, mas é tão IN (no Teatro), que tem mesmo de ser.
… E isto quer então dizer, que se Parabéns houve, então tudo correu bem. Yes!!!!
O prometido é devido, e como gosto de cumprir com o prometido, vou fazer uma a devida “reportagem” acerca do sucedido.
Depois de 4 ensaios em 3 semanas, na sexta feira acordei, com a sensação de que aquele dia era muito importante, porque nada mais justificava a minha ansiedade, a minha falta de calma e os meus sorrisos a tudo o que era gente, objecto e situações alheias ou não…
A seguir ao almoço, já não me aguentava no trabalho, estava tão impaciente, que senti que não produziria nada de jeito naquelas horas até sair, de modo que lá fiquei a fazer mais a rotina que o trabalho, até que com medo de me atrasar um minuto que fosse ao 1º encontro extra ensaio com os outros “actores” (que bem que isto me soa), saí “à Pedreiro” e assim que bateram as 6, comecei a arrumar tudo.
O início do saga do nervosismo começou lindamente, com o meu Director a ligar-me às 6:15 para saber porque eu tinha saído tão cedo – é suposto o meu horário terminar
às 5… Mas admito: contra o meu costume que por norma saio perto das 7, e lá lhe expliquei que era o dia da estreia. Depois chego a casa e tal como planeado a 1ª coisa que faço é começar a tirar o verniz vermelho das unhas – onde é que já se viu uma Criada de servir, em pleno século XIX, ainda por cima a velar uma moribunda, assim com tais modos? Mas em vão – tal era a camada de protecção à cor, que o fantástico “protector de unhas e tira verniz” ao invés da vulgar acetona, não funcionou «Tu e as tuas manias… ‘Da-se!!!» Mas não me fiquei por aqui, porque após desistir de tentar limpar o verniz, zarpei casa fora, e SÓ demorei 48 minutos para fazer o trajecto de casa ao Auditório, quando por norma tem uma duração média de 10…
Bom, lá cheguei ao restaurante e quando vi que estavam calmamente todos a aguardar os atrasados, pensei: «porquê o teu nervosismo? Afinal eles é que têm as maiores falas e performance…» acalmei-me. Pedi uma Coca-Cola e fumei um cigarro. Então disse ao Encenador que estava com um problema gravíssimo e mostro-lhe as unhas: 1º não ligou nenhum, mas depois disse que tínhamos de arranjar acetona e mandou um dos “actores” correr à loja dos Chineses, mas eis que surge o Sr. Luis com a caixa da caracterização. Assunto resolvido – «Aqui há tudo: Há Acetona boa, e até verniz!» O Sr. Luis, Sr. Caetano na peça , é o mais velho de todos nós, mas além de “actor” há muitos anos, também é “caracterizador”...

Não sou capaz de descrever o que se seguiu, porque quando os primeiros convidados começaram a chegar, nós ainda andávamos a montar o cenário, e eu totalmente inexperiente sentia-me como um passarinho assustado, um Canário tão pequenino que ninguém vê, porque os olhos estariam nos Piriquitos e nos Papagaios, mas ai do Canário se não cantasse… «Onde estão as minhas chávenas? E o Café? E Bandeja? Então só há 11 chavenas?» - é que eu também ia servir o público, e nunca tinha ensaiado com as chávenas todas, nem com elas cheias, e era suposto serem 16 e não 11… Mas todos me diziam, para ter calma e sorriam. E andava eu ali vestida de Criada, com uma linda rendinha na cabeça a empurrar cenários, a pintar cabelos de branco e olhos de preto aos outros 2 segundos protagonistas (eram 2 peças distintas), e a puxar as minhas mini meias pelas coxas acima que teimavam em enrolarem-se sobre elas mesmas – é que os collants da Criada Antónia não apareceram…
Não bastava isto, vem-me o Encenador dizer que eu tinha de ter muita atenção a quem ia servir o café, porque a 1ª fila toda estava reservada a deficientes: - «Vês? E não sei se eles te pegam nas chávenas…» - «Ora essa!», disse uma senhora que já estava sentada. - «Então acha que eles aceitam o café e o tomam?» perguntei eu - «Eles só são surdos!» Dispenso comentários. AAAAAAaaaAAAAAAAAA
Finalmente tudo a postos, o Encenador manda toda à gente às suas marcações.
- «Muita Merda!» «Merda! Merda!» «Muita Merda para ti»
- «Mas então e o pano? A cortina? Não se fecha? » Não havia. Estava avariado. Tínhamos de estar todos sentadinhos nos nossos lugares, sem pestanejar, até que toda a sala se enchesse, até que todos os avisos fossem feitos, até que todas as luzes se apagassem e até que a música começasse. Aí, a Criada Antónia começa a peça: Pouso as agulhas da Malha que me tremiam nas mãos, levanto-me e pé ante pé, pego no Candelabro e vou o mais lentamente possível buscar a bandeja. As minhas pernas tremiam TANTO, e o meu coração pulava de tal modo, que os meus Pais me disseram depois, que quando cheguei à plateia, conseguiam ver o meu coração a bater por cima do vestido…
Mas sabem que mais: tudo valeu a pena, porque não me engasguei, nem tropecei, nem entornei café, nem virei chávena alguma, nem estas foram de mais nem de menos, mas antes à certa (!) e nem sequer me enganei nas deixas nem nas falas e, depois das minhas pequenas 7 intervenções, lá me retirei e respirei fundo. Correu tudo bem! Também, tanta Merda tinha que fazer algum efeito…
Depois fiquei caladinha, escondida juntamente com os que também não estavam em cena (atrás dos panos pretos dos lados do palco), a ver os outros actores – esses sim, TODOS tão bem, MESMO!!!! E eu ali aflita com as minhas pequenas falas e a minha diminuta performance… E depois tão jovens e tão boa onda!!! A Carolina – Protagonista nas duas Peças, e o Paulo, e os Filipes - um deles o Avejão, é quem ia entrar comigo à "boca de cena" para os agradecimentos! É, é verdade também há agradecimentos... E palmas... Eu não merecia…
Tal como não merecia tanto aplauso quando saí dos camarins e me dirigi à entrada, e vejo aquela recepção toda… O sorriso dos meus Pais… O abraço das minhas Avós, os meus amigos mais queridos, todos ali! (ou quase-quase todos)…
E o Girassol que a minha Tia levou…
Olhem, só vos digo: todas as tremuras me passaram das mãos e pernas para os lábios, porque eu já não sabia como sorrir mais.

09 outubro, 2006

Amadora

Eu era a Meretriz... Mas foi só um papel – uma curta participação no Auto da barca do Inferno de Gil Vicente – a 1ª (e única) vez que fiz teatro. Foi no secundário e eu teria uns 12 ou 13 anos, e só os alunos e professores da escola é que assistiram. E adorei.
Desde sempre tive um bichinho que me dizia que devia pelo menos experimentar.
Assim, desde há um ano para cá venho pensando nisso… Era para amanhã, para o outro mês, para depois das férias, para o início do Ano… Enfim, fui adiando sempre.
Mas na semana passada, decidi que ia averiguar, apalpar terreno como se diz.
Procurei procurei procurei, mas só vi coisas profissionais, que não era de todo o que me interessava. Queria algo para desanuviar, na tanga, para fazer algo de novo, de divertido que me ocupasse um pouco o tempo livre, queria conhecer gente e claro, experimentar fazer teatro. Amador!!
Isto levou a que acabasse por procurar Associações recreativas, culturais e afins na minha área de residência.
Pasmei quando vi a quantidade de Associações que existiam só naquele Conselho, e mais pasma fiquei quando vi o número de Sociedades Columbófilas (Jazuze!!! Para quê tanto Pombo???? E cadê eles??)………
Bom, acabei por ir parar a uma associação lá ao pé de casa que tinha um encenador que só fazia Revista! Lá fui ver, e apreciar. Era “ajeitadinha”, tinha condições, um mini Teatro, com um belo palco e uma plateia e tudo nas traseiras da associação, “profissionais” do som e das luzes, figurinistas e encenador e tudo! Muita gente (cerca de 43 pessoas em palco), eram jovens e adultos com um fosso de idades entre os 20 e poucos e os 40 e muitos (eu estava portanto no meio do buraco…), mas meus caros: aquilo era mesmo brejeiro do mais pobre que há… Uma peçazinha em exibição há 1 ano e meio e para continuar (disse-me o Sr. Presidente, que «bem queremos acabar com esta, mas são tantas as solicitações…»), depois as rapariguinhas de 18 aninhos a cantarem, nem comento. E a dançarem? Só visto. Mas mais, a peça era sobre o S. João, e ainda anda em cena???? Sempre? Durante mais de 18 meses?!!
O Sr. Presidente disse-me que eu tinha mais que jeito, e que apesar de eu preferir o Teatro clássico à Revista, era uma questão de entrar e aí… E jeito? Oh: Eu tinha «mais que jeito! Via-se!» (eu que nem me levantei da cadeira…)
Bom, não era o que tinha em mente e então lá meti a procurar outras associações. Fui parar a uma outra em que o SER que a dirigia, me deu literalmente a volta por telefone, porque quando falamos fiquei não só com a nítida sensação de que ia fazer parte de um projecto a iniciar, como com a alegria de que estava já seleccionada para os testes de voz e leitura a realizarem-se na 2ª feira a seguir.
Meus amigos: que FIASCO!!! Começou logo pelo local - e ainda bem que levei 2 amigos comigo para me darem força... Mal saímos do carro senti dezenas de olhos a nos mirarem, que no café da Associação se refastelavam a ver a novela; o sitio não era de facto aprazível, mas metemos a 1ª impressão para dentro da gaveta e seguimos em frente, mas já estava quase que arrependida de me ter metido naquilo - num Bairro (literalmente e, não no sentido pejorativo mas sim na fealdade que de facto a maioria tem), e que não era sequer o meu… Mal habituada estava eu a estes hábitos de recreação…
Mas depois aquele Senhor, que já representava há 2 anos e que além de ser o Presidente iria ser também o protagonista principal e encenador – era na verdade um SER (!), que mais mal que bem, tinha vontade de levar aquilo avante, mas valha-nos Deus, até eu que nunca participei em nada destas coisas, fiz melhor papel que ele.
Primeiro, foi o facto de me dizer que já estava tudo preparado, mas das supostas 9 personagens –“só faltava o meu papel de mulher do presidente da Junta”, não fora eu levar comigo 2 pesoas (que me iam apoiar simplesmente), só existiam 4 "actores"… Depois foi a entrega dos papeis - mesmo aos meus amigos, que NÃO queriam participar; depois foi a leitura, onde todos leram razoavelmente bem, menos o SER, que boa vontade ele tinha, mas jeito… Enfim.
Saímos dali com a marcação de novo ensaio para a 4ª seguinte, mas logo decidimos que aquilo não ia dar em nada, apesar da peça ser uma comédia, básica mas muito engraçada e de até mesmo nós já termos os papeis quase interiorizados…
Lá liguei no dia seguinte a comunicar a desistência e a desejar Boa Sorte.
Fiquei tristinha. Confesso. Queria mesmo começar logo a participar, de modo que procurar associações com experiência dramática iria significar que as peças já estariam a rolar, pelo que os “Castings” estariam mais que feitos…
Meio desanimada, encontrei uma associação numa Freguesia próxima, mas que só aceitava inscrições em Janeiro e foi assim que, mais por descargo de consciência que por esperança, me dirigi à minha última hipotese.
Na mesma freguesia, existia o Grupo Dramático amador com maior expressão e tradição no distrito do Porto, mas “era óbvio, que não me vão aceitar assim, sem mais nem menos a meio de duas peças que já estão a decorrer. Eu que nem sou da Freguesia!...”
MAS... Mas! há sempre um mas.
Caí lá no preciso momento de um ensaio, onde uma das “actrizes” se tinha visto obrigada a sair por motivos profissionais há dias e, estavam mesmo a precisar de alguém para o papel de Criada Antónia, na Peça “O Avejão” do Raul Brandão.
É lógico que o meu, é um papel menor, com poucas deixas, mas há que começar passo a passo. E além do mais, aquilo sim, era uma coisa “à séria” e com tudo novo – Palco decente e grande plateia, camarins, sala de ensaios, cenários, guarda-roupa, som, luzes e Acção!!! Estava maravilhada.
O Encenador – na verdadeira acepção da palavra, pareceu-me de facto um encenador (também, com 33 anos de experiência e tamanho curriculum, só poderia), se calhar por aflição mediante a proximidade da estreia, ou porque achou que eu era uma “Amadora – aquela que ama o teatro”, me ofereceu o papel.
E agora? Agora assim, do pé para a mão, quando menos esperei, e quanto mais imaginei que «naquela "Associação Mais-Mais", eu não vou conseguir entrar» – Zás:
- Dia 27 vou servir cafés, ao vivo e a cores.